segunda-feira, 27 de maio de 2013

Governo privilegia empresa da Frelimo

      
Corredor de Macuze gera controvérsia O governo está envolvido numa nova confusão na cobiçada área dos grandes projectos, depois de ter decidido atribuir, sem concurso público, o contrato para o projecto de desenvolvimento do futuro Corredor de Macuze, na província da Zambézia, a um consórcio indo-moçambicano que inclui a principal holding da Frelimo, a SPI.
O referido projecto envolve a construção de um porto em Macuze e de uma linha férrea ligando este ao distrito de Moatize, Tete, via Caia. O novo porto, situado a norte de Quelimane, deverá dispor de uma capacidade de processamento anual de 20 milhões de toneladas de carvão, com possibilidade futura de duplicação. Ao que o SAVANA apurou, o projecto ferro-portuário está avaliado em USD 3.1 mil milhões. As notórias deficiências das infra-estruturas de transportes têm sido o principal problema enfrentado pelas mineradoras, principalmente as baseadas em Tete, para escoarem a sua produção. Várias estimativas indicam que Moçambique poderá produzir cerca de 100 milhões de toneladas de carvão por ano no período pós-2015, quando todas as maiores minas de Tete estiverem operacionais.

Actualmente, para além da Linha Sena e do projecto de Nacala (já em execução a cargo da Vale), há pelo menos mais dois projectos alternativos para a exportação de carvão, em adição a Macuze. Trata-se da linha Moatize-Nacala, via Mutarara-Vila Nova da Fronteira, uma concessão atribuída sem concurso público à ENRC (Eurasian Natural Ressources Corporation) representada por José Dai, familiar do presidente Guebuza e o ramal (com origem em Moatize) Mutarara-Mutuáli-Nacala sob a égide dos CFM (Caminhos de Ferro de Moçambique).
Pré-seleccionados
Inicialmente, de 21 concorrentes, seis empresas foram pré-seleccionadas para submeterem propostas num concurso cujo vencedor seria anunciado em Julho, sendo as propostas entregues até 29 de Maio corrente. Porém, e depois da pré-selecção ter sido anunciada publicamente pelo ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula, o concurso foi aparentemente cancelado com ordens para que se fizesse adjudicação directa ao consórcio de que faz parte a SPI, o braço económico da Frelimo. Ao tomarem conhecimento da decisão por fonte governamental, algumas empresas que haviam sido pré-seleccionadas questionam a decisão e prometem levar o caso até às últimas consequências. Um dos protestos vem do Codiza-Corredor de Desenvolvimento Comunitário da Região do Vale do Zambeze. O Codiza, que formou um consórcio com a portuguesa Mota Engil, terá já protestado junto do ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula e do Primeiro-Ministro Vaquina. Em contacto com o SAVANA, o gabinete do PM, através de Celina Herinques, assessora de imprensa, confirmou que Alberto Vaquina recebeu os representantes do Codiza no final da tarde desta terça-feira. Foi-lhes informado que deviam buscar explicações no ministério dos Transportes e Comunicações entidade que está a gerir o dossier. 
Na lista dos seis pré-seleccionados, o Codiza ocupou o terceiro lugar e terá dito ao ministro Zucula que levará este assunto até às últimas consequências. O projecto do corredor de Macuze tem um traçado ferroviário menor que a actual Linha de Sena – 525 quilómetros – embora tenha como contratempo atravessar uma vasta área de pântanos na Baixa Zambézia, o que aumenta os custos de engenharia, dado que terão de ser construídos vários lances de linha em suspensão.
O Codiza é ele próprio um consórcio moçambicano onde avulta a empresa Transzambézia, uma sociedade comercial formada por mais de 150 pequenos e médios investidores com epicentro na província da Zambézia.
O SAVANA soube de fontes bem informadas que a Rio Tinto também se mostrou supreendida pela decisão governamental de adjudicar este projecto sem concurso. A mineradora aglo-australiana que explora a mina de Benga, em Tete, estava na esperança de se ver “indirectamente ressarcida”, após o Governo ter chumbado em tempos a proposta fluvial de transporte de carvão via Rio Zambeze.
Segundo apurou o SAVANA, a história começou em Maio de 2011, quando um consórcio indiano, a Patel Engineering, assinou um Memorando de Entendimento com o governo, autorizando-a a realizar um estudo de pré-viabilidade económica do projecto.
O Memorando de Entendimento, assinado através do Ministério dos Transportes e Comunicações (MTC), dava à Patel Engineering o direito exclusivo de realizar o estudo e de preferência no concurso público que seria lançado para o desenvolvimento e exploração do projecto. Mas não lhe conferia o direito a uma adjudicação directa.
O direito de preferência consistiria na atribuição de 15 pontos de vantagem na classificação final em relação aos outros concorrentes.
As nossas fontes indicam que foram estes 15 pontos de vantagem que permitiram à Patel Engeneering posicionar-se  em último lugar de entre as seis empresas pré-seleccionadas para o concurso. Ao que o SAVANA apurou, a tailandesa  Italthai Engineering lidera a lista dos pré-seleccionados, seguida da japonesa Sumitomo, o consórcio Codiza/Mota Engil, o consórcio CLZ (Investe Logistica, CCCC China e Aurizon), a anglo-australiana Rio Tinto e por fim a SPI/Patel Engineering/Grinrod.
Os protestos em torno de Macuze não vêm de agora. Decorrente da decisão de lançamento de um concurso público, a Patel Engineering lançou uma poderosa operação de lobbies junto de entidades oficiais moçambicanas, incluindo o Primeiro-Ministro, Alberto Vaquina.
Segundo as nossas fontes, a Patel Engineering terá igualmente apresentado queixa às autoridades indianas, cujo Ministério dos Negócios Estrangeiros convocou, José Maria Morais, o Alto Comissário de Moçambique naquele país, para exigir explicações.
Terá sido neste intenso lobby que a Patel Engineering forjou a sua aliança com a SPI, a poderosa holding da Frelimo.

A mão de Vaquina?
Na sequência, o Ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula, terá sido convocado para um encontro de “puxão de orelhas” com Vaquina.
Foi nesse encontro que Zucula decidiu recuar na sua intenção de respeitar a lei. O passo seguinte foi pedir autorização ao Conselho de Ministros para a adjudicação directa.
Fontes contactadas pelo SAVANA consideram ser estranho que num conflito envolvendo um funcionário superior do seu governo e uma empresa estrangeira, o Conselho de Ministros se tenha inclinado “de mão beijada” ao investidor estrangeiro, sem se dar ao trabalho de qualquer investigação para o apuramento dos factos.
Apontam igualmente para o triste cenário da Linha de Sena, onde decisões pouco criteriosas sobre matérias económicas atribuiram um contrato a um outro consórcio indiano para a reabilitação daquele importante sistema ferroviário. Anos após a atribuição do concurso, o referido consórcio viria a ser afastado por incumprimento de cláusulas contratuais, resultando nos actuais problemas que têm estado a afectar negativamente o escoamento do carvão produzido na bacia de Moatize, em Tete. Depois na inoperacionalidade da linha este ano, pelo menos dois graneleiros foram afastados do porto da Beira, obrigando as duas maiores mineradoras – a Vale e a Rio Tinto – a declarar motivo de “força maior” para não respeitarem os seus contratos de exportação de carvão.
A crise de infra-estruras é tal que se estuda actualmente uma nova possibilidade para o transporte de minério por via de corredores rodoviários especiais, uma proposta vista pelos ambientalistas como muito controversa.
Ao que o SAVANA apurou, foi sugerido ao MTC que a concessão da Linha de Sena poderia ser atribuída ao Codiza, deixando-se cair o “forcing” em Macuze, mas a concessão, aparentemente, já está reservada para a Aurizon, a companhia australiana apadrinhada em Moçambique por um familiar directo do presidente Guebuza.
Até ao fecho da presente edição não foi possível ouvir o Ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula.

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