sexta-feira, 14 de março de 2014

EDITORIAL: Ingerência ou pouca-vergonha?

EDITORIAL: Ingerência ou pouca-vergonha?




Ficámos a saber, através do Canal de Moçambique, que parte dos doadores para o Orçamento do Estado condiciona a sua ajuda e exige explicações sobre os contornos do negócio da EMATUM, uma empresa participada pelo SISE. Através do mesmo órgão de informação soubemos, também, que o Governo liderado por Armando Guebuza não tugiu nem mugiu. Ou seja, deixou os doadores sem resposta e a explicação para tanta desfaçatez reside, como é óbvio, na velha e necessário desculpa de que não se pode permitir, de forma alguma, a ingerência de forças externas em assuntos que dizem respeito aos moçambicanos.
Concordamos plenamente com a posição do Governo. E até louvamos. Mas agora, de moçambicanos para moçambicanos, exigimos que nos esclareçam sobre os contornos desse negócio. Até porque mais de 800 milhões de dólares não é pouca coisa, sobretudo quando esse mesmo valor conta com o Estado como avalista de uma empresa sem NUIT e derivados.
Julgamos, na qualidade de moçambicanos, que despesas do género não podem nascer eivadas de vícios e de espécie alguma de secretismo. Nesta época de gastos exorbitantes e de regalias igualmente enormes, esse secretismo não é benéfico para a imagem do Executivo liderado por Guebuza. Contudo, a má imagem com que se fica com este negócio obscuro não é tudo o que tememos. Há questões que não querem calar e na qualidade de cidadãos nacionais devemos colocar: é mais importante pescar ATUM via uma empresa participada pelo SISE do que apostar na educação e na saúde? A nossas prioridades são deveras preocupantes.
Alugamos helicópteros para Presidências Abertas. Compramos carros topo de gama para governantes. Construímos edifícios de 70 milhões de dólares para apalpar as partes íntimas da auto-estima. Edificamos uma circular da forma mais dispendiosa possível. Em contrapartida, os hospitais não têm medicamentos. O livro escolar não chega para todos e as carteiras rareiam nos estabelecimentos de ensino. Afinal, o que queremos e onde pretendemos chegar com esta inversão de valores e prioridades? Um país que nada tem a temer não pode, de forma alguma, trancafiar a sete chaves a sua relação com a gestão da coisa pública. A EMATUM é apenas a ponta do icebergue da nossa pouca vergonha.
@VERDADE – 13.03.2014

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