Um sistema em que os “aplicadores da lei” viram criminosos, mas recebem protecção das magistraturas. É
assim que Benvinda Levi caracteriza a actuação das magistraturas
Judicial e do Ministério Público perante os magistrados acusados de
envolvimento no mundo do crime.
Na
reunião anual de balanço das actividades do Centro de Formação Jurídica
e Judiciária, a antiga ministra da Justiça e conselheira do Presidente
da República foi uma das convidadas para refletir sobre os novos
desafios da formação de juízes, procuradores e conservadores.
Numa
altura em que se questiona a integridade de alguns magistrados, não
poupou nas críticas. “Hoje, falar de um magistrado, em alguns casos, é
quase que falar de um criminoso, quase é sinónimo. A credibilidade está
bastante posta em causa, porque nós não usamos os mecanismos que temos
para fazer a filtragem”.
E
essa filtragem, segundo Levi, não acontece simplesmente porque os
conselhos superiores de magistratura preferem proteger os seus membros.
Para o caso dos juízes, de acordo com o Estatuto dos Magistrados
Judiciais, aprovado de Julho de 2009, o Conselho Superior de
Magistratura Judicial tem a competência de “processar e julgar as
suspeições levantadas contra qualquer um dos seus membros em processos
da sua competência”.
A
juíza de profissão diz que o proteccionismo faz com que estes órgãos
passem por cima desta norma. “Temos sido demasiadamente corporativistas e
protegemos aquilo que não se protege. Preferimos proteger, não sei se é
para não nos expormos”, denunciou a também antiga directora do Centro
de Formação Jurídica e Judiciária, para a seguir alertar: “Mas as
magistraturas têm que fazer o seu trabalho. Se a pessoa não responde aos
requisitos, viola as normas, essa pessoa tem que ser responsabilizada
pela violação dessas normas. Isso tem que ser claro”.
Ao
posicionamento da antiga ministra, juntaram-se vozes ainda no activo no
sistema de justiça. Adelino Laice, director nacional de Assistência
Jurídica e Judiciária, no Instituto de Assistência e Patrocínio Judírico
(IPAJ) referiu que “Há muitos magistrados com abordagens atípicas,
abordagens que não os identificam como integrantes desta classe. isto está a corromper e a manchar o trabalho de quem forma, no caso o Centro”.
Ética e deontologia na formação
No
encontro que também visava buscar soluções para os desafios da
formação, Carlos Mondlane propôs a introdução de cadeiras de ética e
deontologia na formação dos juízes, procuradores e conservadores, para
ajudar os profissionais a preservar a sua integridade. “Ao invés de nos
culparmos uns aos outros, temos que ver quem pratica tal corrupção. Esses
comportamentos ímprobos são praticados no nosso meio social e o grande
desafio passa por tudo falar sobre eles, procurando incutir valores de
boa conduta social”, concluiu.
Histórico sobre magistrados processados
Juíza
Judite Simão, do Tribunal Judicial de Marracuene, expulsa da
magistratura judicial depois do processo disciplinar relacionado com uma
acusação de corrupção no “caso Milhulamete.”
Abril de 2017
Roberto Eugénio Balate, juiz da 2ª secção
do Tribunal Judicial da Província de Manica, expulso por ter ordenado o
levantamento de dinheiro na conta daquele tribunal.
Agosto de 2014
Três
juízes das províncias de Maputo e Nampula levados à justiça por
envolvimento em actos de corrupção. Juiz acusado de corrupção por ter
exigido cinco mil meticais a um arguido.
2012
Ministério
Público instaura 21 processos disciplinares e oito de inquérito.
Procurador expulso, registadas quatro repreensões, uma multa, duas
aposentações compulsivas e três transferências.
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