segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

LOBO E CARNEIRO PASSARÃO A TER MAIS PASTO PARA AMBOS

Partilhando um pensamento de Gustavo Mavie...

--- INÍCIO ---

LOBO E CARNEIRO PASSARÃO A TER MAIS PASTO PARA AMBOS

Por Gustavo Mavie

"Em democracia, não aceitar a vitória dos
outros, e exigir a igualdade, culmina em o
derrotado abocanhar-se do vencedor, e forçá-lo
a rebaixar-se até ao nível do vencido."
Alex Tocqueville, In: Democracy in America, 1848.
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Depois da proclamação de Armando Guebuza e da Frelimo como vencedores das eleições gerais de 2004, defendi numa reunião de quadros da Frelimo que para que Moçambique não volte a ser alvo duma guerra da Perdiz, era imperioso que se nomeassem alguns dos seus quadros para cargos de direcção de relevo pelo menos nas empresas públicas, para que estes não continuem a se queixar de serem excluídos, como já estavam lamentando ruidosamente na altura.
Para dar mais argamassa à minha proposta, argumentei com base no teorema do clássico chinês Su Tzu e autor do célebre livro "A Arte da Guerra", que sempre defendia que os soldados inimigos derrotados, devem ser bem tratados e acarinhados, para que possam servir a Pátria que antes queriam destruir. Reforcei, citando Jesus Cristo, que recomendou que devemos amar os nossos inimigos.
Infelizmente, não fui então compreendido por alguns dos que estavam nessa reunião, e que claramente não queriam que se desse nada aos derrotados, para que todos os postos existentes pudessem ser distribuídos pelos camaradas. Ficou mais do que evidente que se recusaram para que nenhum deles perdesse a oportunidade de ser nomeado para tais cargos. Alguns deixaram claro que viam essa minha proposta como quem estivesse a defender que se entregasse ouro ao bandido. Mesmo assim, avisei que caso a Frelimo não atribuísse alguns postos de relevo aos membros da oposição, e se continuasse a se nomear mais os da "Maçaroca", havia o risco dos membros da Frelimo serem considerados como os "tutsis" de Moçambique. Só que, tudo o que disse foi em vão, porque esta minha proposta foi sumariamente rejeitada. Para testemunhar o que aqui digo, o meu amigo Kandiane waMatuva Kandia creio que pode confirmar que defendi isto nessa reunião tão inédita, porque notei nela que estava repleta de caçadores de nomeações pelo Guebuza. Notei isso quando se apresentavam, porque houve muitos que davam todos os seus CVs, desde o ensino primário, passando pelo secundário até ao superior e superioríssimo, isto é, aquele que outorga os títulos de PhDs ou duplos PhDs, como os que se apresentaram como Professores Doutores Engenheiros. Aquilo só visto meu Deus! Apesar de que era uma reunião partidária, alguns estavam endumentados com as suas coloridas togas, como se fosse académica! Aquilo era o cúmulo da exposição dos canudos!

O MEU RECEIO DE RETORNO À GUERRA NÃO TARDOU A SE CONCRETIZAR
O meu receio de que a Renamo não se sentia satisfeita em ter só os deputados que conseguia eleger para a AR, e pelos poucos membros que foi conseguindo forçar a sua integração em certos serviços públicos, como a CNE, o STAE e pouco mais, revelou-se quando a Perdiz submeteu ao Governo, em 2013, uma carta em que eufemísticamente solicitava um diálogo que, como sabemos agora, foi o PONTO DE PARTIDA de toda a bagunça político-militar que ainda hoje se arrasta, e que tem como sua quase resultante final os chamados "Consensos" entre Nyusi e Dhlakama, agora entregues ao Parlamento para possível aprovação. Quando a Renamo submeteu tal carta, eu escrevi na altura um artigo com o título "RENAMO EXIGE MAIS DINHEIRO AO GOVERNO PARA MANTER A PAZ NO PAÍS", em que dizia claramente que o que a PERDIZ exigia de facto através dessa sua missiva era mais partilha dos benefícios do poder que a Frelimo vem desfrutando quase sozinha desde a independência em 1975.
Nesse artigo que escrevi a 28 de Abril de 2013, dizia nos seus primeiros quatro parágrafos o seguinte:
«A liderança da Renamo acaba de confirmar, de forma tácita, que exige mais dinheiro do governo, para além dos três milhões de meticais (cerca de 100 mil dólares ao câmbio corrente) que, segundo o seu antigo secretário-geral, vem recebendo, e que em 1992 se situava naquele montante que agora pode ter sido incrementado no orçamento deste ano de 2013. (…) A Renamo diz que precisa de mais dinheiro acima dos três milhões para garantir a transição da sua antiga força militar em partido político, de forma "tranquila e sem grandes sobressaltos". Esta exigência vem contida numa carta endereçada ao Executivo moçambicano, datada de 26 de Abril corrente, na qual solicita a retomada urgente do diálogo mantido entre as duas partes no ano passado, e que veio a ser abandonado pela própria Renamo alegando que não havia lá seriedade da parte do Governo. Na carta, a liderança da Renamo exige este aumento do dinheiro sob o argumento de que tendo “a Renamo sido signatária e parceira do Governo no AGP, não entende porque razão contínua pura e simplesmente excluída do usufruto de toda a riqueza que é fruto da paz que ajudou a conquistar e manter durante estes vinte anos.»
Estes extractos dessa carta assinada pelo Dr. Augusto Mateus, Chefe do Gabinete do líder da Renamo, indica claramente que a Renamo sente-se no direito inalienável de desfrutar elasticamente das riquezas do país, apenas pelo facto de ter sido um dos signatários do Acordo Geral de Paz (AGP) de Roma em 1992. Digo elasticamente porque os três milhões que já recebem são provenientes dessas riquezas e não uma oferenda divina. Muito embora seja temperada com argumentos e até sofismas com que tenta dar-lhe cores que tornem esta sua exigência aceitável, a liderança da Renamo diz que ela não está em condições de fazer a transição de uma organização militar para partido político. A Renamo apresenta muitas outras exigências que deverão ser satisfeitas pelo governo e vinca que "para manter uma máquina como a Renamo, exige-se uma robustez financeira que passa, necessariamente, pela criação de condições concretas".
Como claramente se apercebe destes extractos, quando a Renamo pediu a retomada do dialogo em Abril de 2013, o seu único objectivo era conseguir ter acesso aos recursos duma ou doutra forma, já que pela via do Governo de Unidade Nacional ou GUN, seria impossível, mais porque ela encara sempre a Frelimo como seu visceral inimigo com quem nunca se pode ou deve misturar, se bem que aceita pastar no mesmo pasto, como dizia eu num artigo que escrevi na inauguração do primeiro Parlamento constituído após as eleições gerais de 1994, com o titulo baseado num poema de inspiração bíblica, do poeta brasileiro Thiago Melo, em que faz uso do versículo do Profeta Isaías, que reza que haverá tempos em que "O LOBO E o CARNEIRO PASSARÃO A PASTAR JUNTOS NO MESMO PASTO". O Mesmo pasto neste caso era o Parlamento que passava a integrar pela primeira vez deputados da Frelimo e da Renamo. Este facto era como que o lobo e o carneiro pastarem juntos no mesmo pasto, já que dois anos antes, estavam em guerra entre si e se matavam mutuamente. Mesmo assim, o sentimento de inimizade entre as duas formações políticas manteve-se muito vivo dentro do mesmo Parlamento, revelando-se através das constantes discórdias e proferindo insultos mútuos entre eles, bem como frequentes abandonos da sala de sessões pela bancada da Perdiz ao longo de todas as legislaturas que se constituíram entre 1994 a 2015.
Quando já em Outubro do mesmo ano de 2013 ficou evidente que a não-aceitação do Governo em dar mais dinheiro à Renamo estava a levar Dhlakama a recorrer de novo à força das armas para obrigar o então Executivo de Guebuza a dar-lhe tudo o que queria, publiquei um outro artigo, com o titulo "PERCA DAS EXPECTATIVAS DE CHEGAR AO PODER EXPLICA A NOVA MUSCULAÇÃO BELICISTA DA RENAMO". Neste artigo datado de 10 de Outubro de 2013, vincava que à medida que se aproximava o dia 4 de Outubro em que os moçambicanos assinalaram o 21o. aniversário do Acordo de Roma que determinou o fim da guerra que devastou Moçambique durante 16 anos até 1992, muitos deles multiplicaram as suas interrogações, sobre o que terá acontecido de errado, para que a Renamo voltasse a ensaiar a sua musculatura belicista como o tem feito nos últimos meses.
Nesse artigo, tentei dar uma resposta valendo-me do perito alemão-americano em ciência política Hans Morgenthau, que destaca que quando as expectativas de alguém não são correspondidas, ocorre logo uma frustração, e que, caso a sua não realização dure por muito tempo, há frustração, e que pode passar ao estado de ira ou ódio contra a pessoa ou entidade que é encarado como responsável pela não concretização dessas expectativas. Vinca que caso essa não correspondência dar sinais de se tornar irreversível, aí já o frustrado desemboca na violência. Dizia então que a Renamo já estava na tal fase da violência que protagonizava principalmente na região de Muxungue. Há que revelar que com esta violência a Renamo visava forçar a partilha do poder com a Frelimo, porque tinha já dito que não queria mais que as eleições de 2014 se realizassem. Só à forca de persuasão é que a Perdiz viria a ceder e tomar parte nessas eleições, mas mesmo assim as impugnou liminarmente assim que os seus resultados não lhe foram favoráveis, e reactivou a guerra que já vinha movendo contra Guebuza, já contra o governo de Nyusi. Era a aplicação da tese que reza que ou comemos juntos ou queimo tudo.

RENAMO ENCARA OS CONSENSOS COMO MAIS PASTO TAMBÉM PARA SI
Logo depois da divulgação dos consensos a que o Presidente Filipe Nyusi e o líder da Renamo chegaram, conclui que a condição que a Perdiz impôs para que não mais mova a guerra que por diversas vezes reactivou entre 2012 e 2016 antes de Dhlakama decretar tréguas, é o Governo dar-lhe mais pasto para ambos pastarem, mesmo que venha a perder mais as eleições gerais que no futuro se realizarão no país, como as que estão agendadas para 2019. Assumo que Nyusi acabou aceitando esta exigência de Dhlakama claramente anti-democrática, porque se guiou pelo principio que reza que antes vale perder os anéis que os dedos, que neste caso era o povo que estava sendo morto pela Renamo para forçar a sua exigência.
Para tanto, fica claro que Dhlakama exigiu a Nyusi que se a alterem tanto a Constituição como obviamente também a actual lei eleitoral que até aqui preconiza que só quem ganha mais votos em eleições gerais, é que governa todo o Pais, incluindo nos distritos ou províncias em que tenha tido menos votos que o partido ou partidos da oposição. Caso este novo modelo acordado entre Nyusi e Dhlakama seja aprovado pelo Parlamento, como tudo indica que será como moeda de troca para a paz, Moçambique poderá ser o primeiro País do Mundo em que o partido mais votado já não poderá ser proclamado como quem deverá governar sozinho toda a extensão territorial que compraz esse país, como é prática em todos os países de democracia multipartidária, salvo nos países em que há eleições específicas para a eleição directa dos dirigentes locais, como na África do Sul e nos EUA, em que há eleições só para eleger os governadores das províncias (RSA) ou Estados (EUA).
Na verdade, este novo modelo eleitoral preconiza uma alteração às leis que até aqui preconizavam que governa todo o território, o partido político que seja o mais votado, para se passar a determinar que independentemente dum certo partido ter sido o mais preferido pelo somatório dos eleitores de todo o país, só terá o direito de governar apenas naqueles distritos e províncias em que seus habitantes tenham votado maioritariamente a seu favor, enquanto naqueles ou naquelas que os seus residentes tenham optado maioritariamente por outros partidos, serão governados por esses partidos.
O que me leva a assumir que estes CONSENSOS visam permitir que os membros da Renamo tenham também mais pasto à sua disposição do que o que até aqui têm, é que estes consensos permitem que mesmo quem perca as eleições, governe nos territórios onde "ganhou". É que com base na actual lei eleitoral, somente quem é proclamado vencedor tem o direito de nomear os governantes de todo o Pais, desde a localidade e posto administrativo, passando pelo distrito, província e no preenchimento de toda uma série de vagas de direcção que existirem nos vários serviços públicos dessas possessões territoriais. Mas caso os consensos sejam aprovados, já a prerrogativa de nomear os dirigentes máximos de cada divisão territorial passa a ser da competência do partido que tenha sido o mais votado nesse espaço territorial. Ora, este método dará, potencialmente pelo menos, mais pasto para os partidos que recorrentemente têm tido preferência do eleitorado de certas zonas do País, como a Frelimo e a Renamo que, invariavelmente, tem sido mais votados em certas províncias, como as do centro do Pais, nomeadamente Sofala, Manica, Zambézia, e ligeiramente na de Nampula e Tete, que tem sido tangencialmente ganhas pela Perdiz.
Esta minha convicção de que os consensos são uma fórmula de expansão do pasto da Renamo, cimenta-se mais ainda pelo facto de Dhlakama estar ainda a exigir que a composição de todas as Forças de Defesa e Segurança seja na base de 50% da Frelimo e 50% da Renamo. Isto deixa mais do que claro, que Dhlakama quer dar tachos aos seus delfins e manifestamente contra a democracia, ao impugnar recorrentemente as vitórias da Frelimo há 30 anos quase, preferindo abocanhar o vencedor e baixá-lo até ao seu nível, tal como dizia Tocqueville, na frase com que começo este meu artigo. Mas como sempre, para manter a sua falsa e enganosa adesão aos princípios democráticos, e continuar a ser visto como o tal "Pai da Democracia em Moçambique", disse semana passada que ele não queria uma eleição indirecta mas sim directa dos governadores e presidentes dos municípios, mas que a Frelimo não aceitou, o que segundo as minhas fontes, não corresponde à verdade. Essas minhas fontes afiançaram-me que Dhlakama é que não aceitou uma eleição directa, porque só assim conseguirá dar os tachos aos seus delfins, como é prática recorrente dele mesmo no seio do seu próprio Partido, onde só ele e apenas ele tem o poder de ordenar e fazer cumprir tudo.
gustavomavie@gmail.com

--- FIM ---

Meu comentário

A última parte desta reflexão de Gustavo Mavie confirma a informação que eu partilhei recentemente neste mural, dando conta que o Afonso Dlakama MENTIU quando disse que a FRELIMO recusou a eleição directa dos governadores probinciais e impôs o fim da eleição directa dos edis municipais.
Renovo o meu apelo para que a Assembleia da República analise os consensos alcançados no diálogo entre o Presidente da República, Filipe Nyusi, e Afonso Dhlakama tendo como referência básica os supremos interesses do povo moçambicanos e não dos seus partidos políticos. Os moçambicanos querem a paz efectiva e o estrito respeito dos seus direitos cívicos e políticos, entre os quais o direito de eleger directamente os seus representantes e dirigentes.
Amém!
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Comentários
Yaqub Sibindy Julião João Cumbane e Gustavo Mavie, ambos são dois camaradas que transportam águas vificantes da nossa Pátria, desaguando no Grande Oceano do Projecto "NOVO MOÇAMBIQUE"!
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3 h
Joana Tchucana Concordo plenamente, sempre tenho dito para conhecer melhor o inimigo é preciso comer com ele no mesmo prato, força amigo não sou muito da política mas não resisto em ler todos seus postes
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3 h
Mebanze Joao Kkkkkkkkkkkkk a primeira parte deste testo "dos cvs apresentações e vestes prof doutor eng..." me fez soltar uma super gargalhada
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2 hEditado
Buene Boaventura Paulo Longo texto, mas excelente, pois é de uma visão de Moçambique, a partir de outra galáxia, num bom telescópio. Parabéns, MAS o assunto ficará resolvido não pelas nomeações... esta mania de que a política é que enche a barriga vai nos afundar.
Afinal o q
ue é preciso em Moçambique? o acesso a informação, a oportunidade e ao investimento deve ser despido de cores partidárias; uma bolsa de estudo para o exterior deve suprimir qualquer referência ao partido ao qual pertence o candidato ou seu encarregado de educação. 
Muitas pessoas sabem fazer muito bem, mas não são da Frelimo e por isto não são permitidas fazer nada, incluindo na gestão das nossas (deficitárias) empresas públicas... ESTE é o síndrome que deve ser eliminado. Pergunte - se quem está no CTA que não tem cartão da Frelimo na actualidade? Isto é que é o problema, porém é um meio caminho andar nas nomeações, MAS não é o que interessa verdadeiramente a este povo.
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2 h
Mouzinho Zacarias Não confio muito no Gustavo mavie este homem andou agitar o governo para exterminar a renamo usando a força das armas
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2 hEditado
Elson Cuna Isso não prova nada. O prof JJC e Gustavo Mavie são 'brothers'' e usuàrios de palavras incendiàrias quando se trata da oposição, pelo que não é de admirar terem combinado para encherem nossos olhos de tanta arreia, tentando a todo custo, desacreditar o DHL

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